Droga para os músculos seduz cada vez mais cedo
A busca obsessiva pelo corpo perfeito, com efeito imediato, fica mais perigosa: jovens de 12 e 13 anos já estão comprando anabolizantes com o objetivo de ganhar musculatura mais rápido. No DF, a falta de fiscalização praticamente libera a venda dos produtos, que só poderiam ser comercializados com receita médica.
É difícil resistir. O menino franzino vê o colega da mesma idade com músculos definidos e se pergunta por que não ser igual a ele. A adolescência é uma fase ingrata, em que a auto-estima em geral está em baixa. Logo, a garotada quer saber o que deveria fazer para ter bíceps forte, barriga travada e costas largas. A resposta vem do colega: ''cara, tô tomando uma vitamina.''
Apesar da falta de pesquisas, a experiência de médicos, professores e pesquisadores revela uma mudança no hábito dos consumidores da droga dos músculos. O interesse começa cada vez mais cedo, a partir dos 13 anos, e não mais após o início da fase adulta. Atraídos pelo apelo da mídia e a necessidade de se mostrar mais forte, a maioria dos garotos se empolga com os resultados rápidos.
Morador do Riacho Fundo I, o estudante T.M.E.A., 17 anos, transformou completamente o corpo magrelo com o uso de anabolizantes. Aos 15 anos, o rapaz tinha 55 quilos. Convencido pelos dois primos, passou a tomar, sem acompanhamento médico, três tipos de bomba. Em quatro meses, os bíceps atingiram 38 centímetros de diâmetro e o peso aumentou para 83 quilos.
''Depois de mudar o corpo, a mulherada caiu em cima'', afirma o garoto. De acordo com T., a mãe sabe que ele usa anabolizantes. Sempre reclama, mas não proíbe o consumo. Para o professor de Educação Física Paulo Henrique Boca, presidente da Associação Brasiliense das Academias de Atividade Física (Asbaaf), a responsabilidade pelo uso dos esteróides na pré-adolescência é dos pais. ''Se em menos de três meses o garoto ganhar musculatura fora do normal, cabe ao pai e à mãe procurar saber o que está acontecendo.''
A venda das substâncias não é ilegal, mas está restrita às farmácias, mediante apresentação da receita médica. A exigência, porém, é burlada facilmente pelos adolescentes. ''Comprar nunca foi problema'', afirma T. Assim como outros adolescentes, se o garoto de 17 anos não consegue receita médica para comprar os anabolizantes, recorre ao mercado clandestino.
No Distrito Federal, apenas 28 distribuidores têm autorização especial da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para comercializar os produtos. O uso irrestrito dos esteróides anabolizantes e a venda de suplementos alimentares é fiscalizado pela polícia.
Sem fiscalização
Ainda assim, as ações são insuficientes para combater o uso dos medicamentos. Nos últimos dois anos, a Delegacia do Consumidor (Decon), em parceria com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, realizou apenas três operações no DF, todas a partir de denúncias anônimas. A maior delas ocorreu em maio deste ano. Fiscais apreenderam na loja Performance, em Taguatinga, especializada em complementos alimentares, cerca de uma tonelada de medicamentos nacionais e importados sem notas fiscais.
Na casa dos três donos, os fiscais encontraram anabolizantes para uso humano e veterinário. Eles respondem a processo por venda de produtos sem registro na Anvisa. Os importados não tinham nota fiscal para comprovar a origem do esteróide. Apesar da ação policial, o estabelecimento continua aberto. Segundo um dos responsáveis pela loja, hoje as vendas se resumem a suplementos alimentares.
O desconhecimento sobre o uso correto dos hormônios pode levar o usuário à morte. Os esteróides anabolizantes são capazes de estimular o desenvolvimento muscular do corpo. São substâncias químicas derivadas da testosterona, o hormônio que dá as características masculinas ao homem. Se tomadas em excesso e sem acompanhamento médico, aumentam os riscos de câncer, impotência sexual, sobrecarga renal, hepática e cardíaca. O uso contínuo causa dependência psicológica.
O segurança R.P.O., 33, usou anabolizantes por dez anos. Teve pancreatite, gastrite e fraqueza constante. Numa noite, acordou vomitando sangue. Foi o alerta para parar. ''Hoje se começa cada vez mais cedo. É muito pesado um moleque de 15, 16 anos tomar substâncias localizadas'', entende R., que começou aos 21 anos. Pai de uma menina pequena, o segurança acredita que os adolescentes são influenciados por filmes e televisão.
''O profissional de Educação Física que vender ou indicar o uso de anabolizantes e até de suplementos alimentares (vitaminas e aminoácidos usados para ganho de massa muscular, resistência física e imunidade) pode ser cassado e processado criminalmente pelo Ministério Público'', avisa Lúcio Rogério dos Santos, presidente do Conselho Regional de Educação Física da 7ª Região (DF, Goiás e Tocantins), o Crefi 7.
O Conselho está de olho nos profissionais que descumprem o Código de Ética, que disciplina a atividade. Lúcio lembra que a função do professor é promover a saúde do aluno por meio da atividade física.
ONDE DENUNCIAR
O uso indevido dos anabolizantes pode ser comunicado nos seguintes telefones:
Delegacia do Consumidor - 362-5932/5933
Conselho Regional de Educação Física da 7ª Região 242-1325
Agência Nacional de Vigilância Sanitária - 325-8554